Um brinde! (Cuidado pra não ser o último…) No Brasil, você compra um iogurte com um morango gigante estampado na frente. Dentro, não tem morango: tem xarope, corante e um aroma batizado de “morango feelings”. A mesma marca, vendida na Europa, é obrigada a ter de 8 a 10% de fruta de verdade. Aqui, basta a fruta estar no rótulo. Não, nem a imagem do morango é verdadeira, é uma imagem gerada por IA. (Tipo essa imagem que eu fiz aí em cima) Quem explicou isso foi a nutricionista e pesquisadora da USP, Sophie Deram, em entrevista à BBC Brasil:
E não é só com iogurte. No Brasil, limites de sódio em alimentos são voluntários. Isso mesmo: voluntários. É como pedir para uma criança: “coma menos doce… mas só se quiser, tá?” Resultado: o consumo médio de sódio do brasileiro é o dobro do recomendado pela OMS, segundo estudo publicado na BMC Medicine. Enquanto isso, na União Europeia, metas de redução são obrigatórias e fiscalizadas. Um levantamento da SciELO mostrou que 77% dos produtos brasileiros cumprem as metas locais de sódio, mas apenas 35% estariam dentro dos limites propostos pela OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde). Ou seja, nossas regras são mais “bonzinhas” com a indústria do que a ciência recomenda. Até o “sorvete de chocolate” é uma pegadinha. Não é nem sorvete, nem chocolate. Muitas vezes não tem leite de verdade, mas gordura vegetal com emulsificante; e não tem cacau, mas açúcar, corante marrom e aroma “idêntico ao natural”. A lei permite que a embalagem prometa creme e chocolate, mas entregue uma versão cosplay dos dois. Na Europa, “ice cream” precisa ter sólidos lácteos e “chocolate” precisa ter cacau em proporções mínimas. Aqui, a gente compra fantasia: sorvete sem leite e chocolate sem cacau. O paralelo com o escândalo do metanol é inevitável. A pessoa sai pra beber uma caipirinha inocente, fecha os olhos pra sentir o prazer da bebida e só abre os olhos na UTI, mas está cega. Motivo? Alguém achou que encher a garrafa com veneno dava mais lucro. Guardadas as proporções, acontece o mesmo no supermercado: não mata de uma vez, mas mina a saúde aos poucos. O crime não está só na caipirinha adulterada, mas no biscoito recheado, no refrigerante e até no “suco” infantil. E, veja a ironia: essa lógica contaminou até os hospitais. Neste momento, meu pai está internado, acabou de sair da UTI e tava com sonda na bexiga. É a sexta vez neste ano. A maioria das vezes teve alguma questão com os rins. Nessa última até pensaram em diálise. E o que serviam de bebida pra ele nessas seis vezes? Suco de caixinha! Um hospital que deveria zelar pela vida oferece açúcar com corante em embalagem Tetra Pak. Não é descuido, é cultura: até na hora da recuperação, o ultraprocessado vem como se fosse tratamento. É como oferecer cigarro no spa antitabagismo. Enquanto isso, seguimos no país da abundância de frutas, legumes e grãos e, paradoxalmente, no país que permite vender “iogurte de morango” sem morango e “sorvete de creme” sem leite. E depois a gente ainda se pergunta por que o povo está cada vez mais doente e obeso.
É o que diz o estudo da Fiocruz Brasília sugerindo que até 2044 cerca de 48 % dos adultos brasileiros terão obesidade e outros 27 % sobrepeso. Nada disso é acidente. O Brasil não é “flexível” por descuido: é por conveniência. A indústria de alimentos é uma das mais poderosas do país e faz lobby pesado em Brasília. Quando o governo ensaiou impor metas mais rígidas, a indústria chorou e conseguiu transformar obrigação em escolha. Na Europa, quem manda é a lei. Aqui, quem manda é a embalagem. Agora me dá licença que eu preciso ir até o hospital fiscalizar se meu pai está bebendo suco de laranja natural ou se a equipe médica achou que caldo colorido com açúcar faz parte da terapia. Atualmente, você é um assinante gratuito de Não É Imprensa. Para uma experiência completa, atualize a sua assinatura. |
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sábado, 4 de outubro de 2025
#CaipirinhaDeMetanol
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